Intervenção de João Martins, na Marcha do Clima, em Tavira
Ponto 1. Ao arrepio
da história – Avançar para a exploração de petróleo e gás natural na Era do
Aquecimento Global
Um primeiro aspecto que gostaria de destacar é o erro histórico
do ponto de vista da decisão política em Portugal e neste caso particular do
Algarve de se avançar para a exploração de petróleo e gás natural num contexto
em que centenas de países, chefes de Estado e líderes de organizações não
governamentais se reúnem em Paris, neste preciso momento, para procurar uma
solução que diminua as emissões de CO2 para a atmosfera. Num contexto em que os
cidadãos. um pouco por todo o mundo, se mobilizam para mitigar o grave problema
do aquecimento global é quando o Algarve decide avançar para a exploração de
hidrocarbonetos. Um erro de proporções históricas que põe em causa todo o
desenvolvimento sustentável da região e um acto egoísta orientado pela mera
lógica do interesse levado a cabo pelas actuais gerações no poder que não tem
em conta o direito a um futuro sustentável das próximas gerações. Relembre-se
que o conceito de desenvolvimento sustentável tem como princípios subjacentes o
equilíbrio entre a dimensão económica, social e ambiental na busca de um
desenvolvimento que, digo eu, se quer durável, e a exploração de petróleo e gás
natural na costa Algarvia estilhaça com uma qualquer ideia de um
desenvolvimento sustentável digno desse nome. O caminho do futuro tem que ser
feito pela via das energias alternativas e a região do Algarve tem enormes
potencialidades sob esse ponto de vista.
Ponto 2. A política
do silêncio – Ao serviço das multinacionais da exploração de petróleo
Um segundo aspecto que gostaria de assinalar tem que ver com o
silêncio dos partidos políticos, da esquerda à direita, e dos políticos do Algarve
(que com raríssimas excepções têm feito ouvir a sua voz) sobre a exploração de
petróleo na nossa costa. Das cartas enviadas pela PALP aos senhores presidentes
das Câmaras Municipais do Algarve apenas dois municípios mostraram interesse
pelo assunto (Silves e Lagoa); não houve uma qualquer menção à exploração de
Petróleo no Algarve durante esta campanha eleitoral que recentemente terminou,
por parte dos políticos a disputar os lugares de deputado no Algarve e há indícios
nos programas eleitorais de alguns partidos (por exemplo, do Partido
Socialista) de uma vontade expressa em apostar em tecnologia de suporte à
exploração de recursos no mar. Mais recentemente a pressão popular já levou a
que o assunto tivesse sido discutido nas Assembleias Municipais de Portimão e
de Olhão. A retirada do secretismo da questão da exploração de petróleo e gás
natural no Algarve foi feita à custa das movimentações da sociedade civil algarvia
que se tem organizado até ao momento para trazer à discussão pública aquilo que
pode vir a ser a expropriação ecológica de toda uma região. Relembro a
excelente iniciativa da PALP em levar uma petição ao parlamento para que este
assunto possa ser discutido no sítio onde ele pode ser resolvido. O I Encontro
Algarve Livre de Petróleo que reuniu dezenas de pessoas em Faro em debate. A
intervenção do humorista algarvio, o Dário Guerreiro – o Môce dum Cabréste, que
através das redes sociais ajudou a despertar um número maior de pessoas para
esta realidade- A constante intervenção da ASMAA, que através da Laurinda
Seabra tem vindo a fazer um trabalho persistente e permanente de
consciencialização das populações; uma exposição de arte levada a cabo por
alguns artistas da região sobre esta mesma temática e o evento deste
fim-de-semana organizado pelo movimento Tavira em Transição. A sociedade civil
começa a ganhar essa aposta mas sem a intervenção do poder político esta luta
não pode ser vencida.
Para além dos riscos ambientais que a indústria petroquímica traz
associada a si ao instalar-se no Algarve (e recorde-se que já há informação
pública de que as condutas de gás natural no caso da exploração de
hidrocarbonetos no mar vêm desembocar nas praias), é importante reforçar que o
Algarve tem esta especificidade da sua imagem de marca do ponto de vista da
actividade económica estar centrada no turismo onde se passa a vida a invocar
nos discursos oficiais a necessidade de um turismo que se quer de excelência.
Podemos sempre discutir e discordar do modelo de desenvolvimento seguido nas
últimas décadas centrado na monocultura do turismo e defender a necessidade de
uma maior aposta na diversificação das actividades económicas mas o pior dos
caminhos é a aposta nesta impossível conciliação entre petróleo e turismo. E a
este propósito vale a pena perguntar. O que pensa disto o senhor Presidente da
Região de Turismo do Algarve? Porque não se pronuncia publicamente sobre este
assunto? Não prejudicará a imagem do turismo no Algarve a exploração de
petróleo em cima das nossas praias? Num contexto em que o turismo de sol e
praia sofre uma concorrência à escala global não me parece que a imagem de que
a região necessita seja a da associação entre a actividade turística e a
actividade petroquímica. Por outro lado, sabemos que os arautos do
desenvolvimentismo a qualquer preço, os mesmos que sempre acusam os defensores
da causa ambiental de fundamentalistas radicais, que mais não fariam do que
alarmar as populações, vão invocar, como é do costume, a criação de postos de
trabalho como um benefício para a região. É necessário desconstruir este
argumento uma vez que os postos de trabalho destruídos serão possivelmente em
muito maior número do que aqueles que a indústria do petróleo pode criar. Outro
argumento poderoso que é preciso rebater são os ganhos económicos que o país, a
região e as populações ganhariam com a exploração de petróleo no Algarve. Os
contratos já conhecidos são claros, os ganhos económicos são irrisórios e
estamos perante o típico negócio em que os lucros são essencialmente privados e
os prejuízos são públicos. E a pergunta que podemos fazer é esta. Então se a
população residente no Algarve não ganha nada com a exploração de petróleo e
gás natural no seu território, se o Estado português faz mais um negócio no
mínimo desastroso e se a região do Algarve como um todo, derivado à sua
especificidade fica a perder com esta decisão ao arrepio do movimento histórico
da necessidade de combater o aquecimento global, porque razão deverão aceitar
os algarvios que a exploração de petróleo entre desta forma abusiva nas suas
vidas?
Ponto 4. – Como
evitar que a catástrofe anunciada se concretize?
Partindo do pressuposto que os riscos inerentes à exploração de
petróleo estão mais do que identificados nas suas várias dimensões; riscos
ambientais, riscos económicos, riscos para a saúde das populações, riscos
sísmicos, riscos sociais e o risco de uma alteração global da qualidade de vida
das populações que vivem no Algarve, como evitar a expropriação ecológica de
toda uma região e a colonização territorial pela indústria petrolífera? Face ao
silêncio do poder político à escala local, territorial e nacional a esperança
tem que vir do trabalho dos movimentos sociais. Esse trabalho está a ser feito
e em meu entender bem feito mas é preciso ir mais longe na mobilização das
populações. Quando se luta com uma das mais poderosas indústrias do mundo não
se auguram facilidades. Um aspecto crucial da luta deste movimento ambiental e
de cidadania tem que estar centrado na sua persistência e permanência.
Organizar mais debates, manifestações, acampadas à porta das Câmaras e
Assembleias Municipais, conquistar aliados políticos institucionalizados,
divulgar muita informação sobre diversas vias, panfletos, redes sociais, boca a
boca, de forma a consciencializar e conquistar mais gente para a causa. Pôr a
criatividade cidadã ao serviço desta luta.
Todas as formas de intervenção democráticas são válidas. Estou crente
que é da mistura entre formas de intervenção política não institucionalizada e
institucionalizada que esta batalha decisiva para o Algarve pode ser ganha.
Sem comentários:
Enviar um comentário