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quarta-feira, setembro 02, 2009

Falhas de Comunicação

Lisboa, 8 de Março de 2008



Depois de ouvir ontem Sócrates reconhecer as "falhas de comunicação" e a falta de "suficiente delicadeza" na relação com os professores e a Ministra da Educação falar em "dificuldades de comunicação" apeteceu-me revisitar este post escrito em 6 de Julho de 2009...

Os Erros de Sócrates: A Educação


A Ministra da Educação é Socióloga. Especializada em Sociologia das Profissões. Não está em jogo a sua competência científica. Está em jogo o seu desprezo pela sociologia das organizações e a sua mobilização na compreensão dos processos de mudança educativa e social. Michel Crozier, é talvez, o sociólogo das organizações mais conhecido em todo o mundo. As obras de Crozier são fundamentais para a compreensão dos processos de mudança social no interior das organizações. Há uns bons anos atrás escreveu uma obra com um título ilucidativo: "A Sociedade Não Muda Por Decreto". Nesta obra já avisava. Podemos fazer as melhores leis do mundo. Sem a participação dos actores, objecto de aplicação dessas leis, a realidade não muda. Em meados dos anos 70, Crozier e Friedberg escreveram "O Actor e o Sistema". Nesta obra sugeriam: a mudança social tem que ser construída colectivamente. Não se pode reformar a sociedade sem os actores. Muito menos contra os actores. Todas as organizações complexas estão imbuídas de relações de poder. Estas relações de poder são decisivas na construção da acção colectiva. O que fez Sócrates e o seu fiel trio do Ministério da Educação? Decidiram unaliteralmente dos processos de mudança. Os professores foram declarados alvos a abater. A determinada altura parecia que a educação era possível sem um dos seus principais actores: os professores. O governo quis conquistar a sociedade em seu apoio contra esta digna categoria profissional. Alunos, pais, e Magalhães eram indispensáveis. Os professores, os problemas do sistema. Depois diabolizou os sindicatos. Se nós temos a maioria absoluta não precisamos de ouvir ninguém. Muito menos escutar o que têm para nos dizer. A mais completa ausência de cultura democrática levou ao desprezo dos sindicatos. Este Governo ainda não percebeu que os sindicatos são agentes legítimos e indispensáveis na construção da legitimidade das políticas educativas. Finalmente, endeusou a tecnologia. A distribuição maciça do Magalhães, uma medida positiva se enquadrada pela necessária cautela em torno dos seus efeitos e dos contextos educativos, acabou na mais pura propaganda política e ideológica. A grande novidade do programa educativo de Sócrates foi o Programa Novas Oportunidades. É difícil não estar de acordo com um programa que se propunha reduzir o maior "défice" da sociedade portuguesa no panorama europeu. O seu défice de qualificações. Mas o programa Novas Oportunidades é o mais perfeito exemplo como um conjunto de ideias epistemologicamente e cientificamente bem sustentadas podem ser desvirtuadas pela prática e pela aplicação política. Para além de reduzir e confundir a educação de adultos aos cursos EFA e aos Centros Novas Oportunidades. Para além de alimentar uma visão educativa redutora, que subordina a educação à economia, numa relação de correspondência acrítica entre estas duas esferas do social, ainda conseguiu enfiar a educação de adultos nas escolas, escolarizando um modelo que não se quer escolarizável, inventando, por fim, a "educação corta-fitas", feita de "metas" que os profissionais no terreno dificilmente conseguem suportar e os adultos realizar. A avaliação de desempenho do governo de Sócrates, com raras excepções, como a escola a tempo inteiro, foi muito, mas muito sofrível. O Governo continua a achar que não. E vai ser assim. Até ao fim da sua vida. É a crise da inteligência política (para utilizar o título de uma das últimas obras de Crozier) em todo o seu esplendor.

Nota: Sobre o autor e as obras referidas ver por exemplo aqui: http://fr.liberpedia.org/Michel_Crozier#Ouvrages

2 comentários:

  1. João está dada a resposta ao seu comentário . Se quiser passar por lá. Obrigado - Palma

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  2. Olá Palma,

    Já lá tinha passado. Um grande abraço!

    Ps: O seu abecedário é um luxo!

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