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sábado, novembro 24, 2007

E se Loulé fosse uma cidade segura?

Nasci em Loulé ainda antes do 25 de Abril de 1974.

Nunca senti medo ou insegurança ao passear pelas ruas de Loulé fosse de noite ou de dia.

Se há 20 anos, a "vila", de traços ainda marcadamente rurais, permitia que toda a comunidade louletana se conhecesse e reconhecesse e esse tecido social comunitário permitia um elevado sentimento de segurança e de proteção comum, hoje a "cidade" de Loulé cresceu bastante, o tecido urbano e "modernizado" complexificou-se e diferenciou-se, não sendo praticamente distinto das principais cidades de média dimensão ao nível nacional.

No início do terceiro milénio o Loulé urbanizado continua a ser uma cidade segura.

As enormes transformações à escala global, nacional, regional e local fizeram com que aumentasse a percepção subjectiva de insegurança, o que em muito difere da insegurança objectiva resultante da real "criminalidade".

Os meios de comunicação em muito contribuem para o aumento dos medos sociais.

Os media não descrevem a realidade, os media "criam" a realidade, ampliando os fenómenos, dando-lhe uma dimensão que muitas vezes ela não tem.
Experimentem ler o Correio da Manhã, ou numa versão mais adequada a esta questão, O Crime e sair para a rua à meia-noite em Loulé e vão ver como reagem a qualquer pobre diabo mal vestido que circule pelas ruas a essa hora. Provavelmente mudarão de passeio.

Mas os políticos também são por vezes responsáveis pelo aumento da percepção subjectiva de insegurança.

A ideologia securitária, principalmente em vésperas de eleições, está sempre pronta a entrar em cena quando se trata de mobilizar mais umas centenas de votos.
Até nauseas tive, ao ouvir o partido socialista em Loulé, nas últimas eleições, apelar à bandeira da "segurança" como forma de apelo ao voto. E não me venham dizer que a retórica da segurança não é de esquerda nem de direita. De demagogia já chega quando os políticos se acusam uns aos outros de demagogia.

Um jornal local, no seu editorial desta semana, chamava a atenção de que as pessoas em Loulé "sentem medo de sair à rua, de estarem sós em casa, ou de mandarem as crianças à escola sem o devido acompanhamento ou protecção" e criticava a "permissividade da justiça portuguesa, muito branda no julgamento destas acções" da pequena criminalidade.

Como eu gostaria que os jornais tivessem este espírito crítico face à grande criminalidade de "colarinho branco" que tão danosa é à sociedade portuguesa.
A lei da proximidade social, faz com que se olhe para o que está perto de nós e perto de nós estão os pobres e desgraçados que recorrem ao pequeno crime de meia tigela.

Aumentou também a heterogeneidade cultural. Cruzamos em Loulé com brasileiros, com russos, com ucrânianos, com chineses, com africanos e ao Sábado de manhã com uma Torre de Babel cultural fantástica. A diferença provoca receio e o desconhecido, quando se junta ao facto de a maioria dos imigrantes serem pobres, provoca incómodo. O medo é também o medo da diferença.

Discordo completamente desta leitura da insegurança.

As sociedades da modernidade tardia são sociedades de risco, como lhes chama o sociólogo Ulrich Beck. São sociedades onde reina a incerteza e a insegurança face ao futuro. O mundo de hoje não é mais o mundo de certezas de há 20 ou 30 anos atrás. Loulé não podia evitar este estado de coisas.

A globalização neoliberal aumentou as desigualdades sociais, aumentou o desemprego de longa duração, aumentou o risco do desemprego a qualquer momento, ao sabor de qualquer deslocalização (veja-se o caso da Unicer), aumentou exponencialmente as formas "atípicas" de emprego e de emprego precário, aumentou a pobreza e a exclusão social. Loulé não escapa a este fenómeno de "globalismo localizado", para usar uma expressão de Boaventura Sousa Santos.

Estas são as origens dos actuais medos sociais e do sentimento de insegurança.

Por outro lado, quando a pobreza alastra e as classes medias têm receio de perder o emprego e sofrem fortes quebras no seu nível de vida, como é a situação actual, os pobres e "excluídos" passam a incomodar cada vez mais.

Louis Wacquant, ilustre sociólogo francês, que estuda atentamente a sociedade americana, num livro de bolso que deveria ser de leitura obrigatória para políticos e jornalistas (o livro intitula-se As Prisões da Miséria para quem não sabe), tem vindo a demonstrar com dados empíricos irrefutáveis que o Estado Social nos Estados Unidos tem vindo a ser substituido pelo Estado Penal e que o fenómeno está a alastrar aos países europeus, incluindo Portugal.

As políticas de "guerra à pobreza" dos anos 60 do século XX, têm vindo a ser substiuidas pelas políticas de "guerra aos pobres" e a "criminalização da pobreza" é a política implementada em substituição do combate às desigualdades sociais.

Os orçamentos da segurança interna, das polícias, da militarização e o investimento tecnológico em sistemas de vigilância e de controle dos cidadãos, têm vindo a crescer exponencialmente. O terrorismo legitimou estas políticas. A pobreza e a exclusão social são apêndices nos principais tratados internacionais. As políticas actuais de "coesão social" mais não são do que "remendos sociais" das políticas económicas neoliberais e do capitalismo selvagem global.

Antes de se agitarem os fantasmas da insegurança era bom que os media e os políticos levassem as desigualdades sociais, a pobreza e a exclusão social, a sério. E isso implica mudar as políticas económicas neoliberais.

Como refere o sociólogo J. Young "...a privação crónica pode conduzir os pobres ao crime, do mesmo modo que a ansiedade face à insegurança pode levar os que vivem bem à intolerância e à perseguição".
In Hespanha, Pedro (2001). Mal estar e risco social num mundo globalizado. Edições Afrontamento.

Sinto-me seguro em Loulé...vou ter muita pena...desgosto mesmo... de ver os partidos de esquerda em Loulé agitarem novamente a bandeira da segurança.

Abraços seguros a partir de uma cidade segura

5 comentários:

  1. Concordo com a reflexão, mas há que não ignorar que o aumento das situações de pobreza a par da redução dos meios sociais que a reduza, pode originar conflitos ou pequenos delitos, confundíveis com insegurança.
    Também acho que aos políticos deve caber o trabalho preventivo da insegurança e não o amedrontamento dos cidadãos e muito menos o aproveitamento desse sentimento, em geral mais forte em mentes menos fortes.

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  2. João,

    Tenho o mesmo sentimento do que tu e sinto-me a vontade para falar de segurança em Loulé pois já conheço esta cidade há 35 anos ...!

    Mas o Almeida levantou a ponta do véu e assinalou os problemas actuais que são relacionados com a toxicodependencia e os pequenos furtos que são geradores de uma imagem de insegurança.

    Não quero defender o PS mas a bandeira levantada nas ultimas eleições tinha mais a ver com uma policia municipal com capacidades administrativas para lidar com certos crimes e libertar a maquina juridica dessa area.

    Também concordo que haja algum aproveitamento deste assunto para caçar votos dada a sensibilidade que este problema envolve.

    Mas o importante é assinalar que:
    È Bom viver em Loulé ...!

    E não trocaria este concelho por nenhum outro ...!

    Um abraço da M&M & Cª!

    PS: Acho que a Camila já respondeu e bem á reacção ridicula do Loulé TV que deve ter sido apicaçado pelo executivo da CML para tomar uma atitude descriminatória dada a relevancia que o Blog tem ganho nos ultimos tempos.

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  3. Concordo com tudo o que aqui foi escrito sobre o tema.

    Apesar de alguns furtos que se têm vindo a verificar em estabelecimentos ou sobre pessoas, também eu considero que a cidade de Loulé é e continua a ser uma cidade segura.

    A Miscelânea de culturas que diariamente se cruzam apenas geram maior desconfiança junto da população mais idosa, sobretudo conservadora, dado o impacto de muitas noticias ampliadas por alguma comunicação social mais propensa ao sensacionalismo.

    A recente revisão do Código Processo (des)Penal poderá ser entendido como um "pau de dois bicos": Se por um lado alivia a máquina burocrática dos tribunais, por outro dificulta a investigação.

    Sobre o tema apenas para acrescentar que o que me aborrece mesmo, são os arrumadores e parece que a resolução deste verdadeiro "insulto" social, tarda.

    O PS não o fez e os actuais, idem idem, aspas aspas.

    É que não há carro que aguente!

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  4. Loulé não é de forma alguma o bairro da Musgueira. 1º porque continua a ser uma pequena vila de província e segundo porque a meia duzia de possíveis assaltantes não tem aumentado, felizmente. Quando o PS defendia a Polícia Municipal tinha alguma razão em descansar as populações que lendo o Correio da Manhã todos os dias ficam julgando que o país é um enorme gueto onde as pessoas se andam a matar nas ruas como nas grandes metrópoles.
    E agora espero bem que a tal Televisão de Loulé que odeia blogs
    não crie para aí uma onda de violência sem precedentes...rsrsrs.
    O diabo seja surdo, mudo e não leia
    imprensa de faca e alguidar. Viva sempre Loulé.- Terra de gente boa.
    E que há uns anos atrás era olhada
    como TERRA DE LOULÉ. Mas isso já se foi. Um saludo para este bom blog defensor da nossa pequena localidade algarvia. Gonçalves

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  5. É verdade amigo Gonçalves TERRA DE LOULÉ foi escolhida no tempo do Prof. Vairinhos e tinha originalidade. Depois vieram estes moços e quiseram acabar com tudo que cheirasse a Vairinhou ou Aleixo. Assim trataram de arranjar um Municipio de Loulé à pressa mas como não tivessem gostado passaram a essa coisa original que é Loulé Concelho com a sigla da EDP, de umas peugas que não lembro agora o nome e uns comboios de Espanha. Enfim, meses a fio para os tecnicos descobrirem então uma coisa que já estava mais que descoberta. E gastaram os homens desta Câmara uma
    «porradaria de dinheiro» com esta original sigla. Quem gosta disto ponha o dedo no ar ! NANDO

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