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sábado, outubro 28, 2006

A farsa dos rankings

A divulgação por parte de alguns jornais nacionais dos rankings das escolas secundárias a partir exclusivamente dos resultados dos exames nacionais é uma autêntica farsa nacional.

Farsa, desde logo, porque os rankings são lançados em bruto, ou melhor, à bruta, pois como sabem os cidadãos mais atentos (que infelizmente não são muitos) não se pode comparar aquilo que não é comparável.

Não é comparavel, desde logo, porque os resultados dos exames são descontextualizados em relação à composição social das escolas e ao nível socioeconomico das famílias.

Não é comparável, porque as assimetrias sociais e territoriais transportadas para o interior das escolas não são levadas em conta na análise.

Não é comparável, porque as escolas privadas que aparecem no topo do ranking têm uma composição social claramente favorecida.

Não é comparável, porque as escolas de territórios desfavorecidos e em dificuldade ("problemáticas" como dizem os políticos e os jornalistas)não podem produzir os mesmos resultados das escolas das zonas favorecidas de Lisboa.

Não é comparável, pois comparar as escolas do litoral urbano e com elevado nível de vida, com as escolas do interior rural e com um nível de vida miserável é como comparar a performance de um Ferrari com a de um Mini-Morris dos anos sessenta.

Vale a pena desmistificar alguns questões em relação ao sucesso escolar para não iludirmos as populações e agravarmos ainda mais as desigualdades sociais face à escolarização:

1. Existe um consenso na comunidade cientifica de sociólogos da educação que o capital económico e sobretudo o capital cultural das famílias são quase determinantes no sucesso escolar dos filhos.

Digo quase, porque não havendo uma relação determinista, sabemos hoje que quanto maior o capital económico e cultural das famílias maior a propabilidade que os seus filhos têm de repetir, ou de abandonar precocemente a escola, ter melhores resultados escolares e escolher vias de escolarização que são prestigiadas e prestigiantes em termos dos destinos sociais futuros a atingir.

2. Directamente correlacionado com isto, sabemos também, que a composição social das escolas medida pelo perfil do seu público condiciona fortemente os resultados escolares. Quer isto dizer que numa escola de classes médias e superiores os alunos têm vantagens sobre os alunos de escolas de composição social desfavorecida.

3. Existem estudos que indicam que os próprios professores "fogem" das escolas com composição social desfavorecida como quem foge da lepra, o que quer dizer que os "melhores" professores vão leccionar para as "melhores" escolas agravando ainda mais as desigualdades.

4. Os próprios resultados do ranking, feitos em bruto e à bruta, mesmo descontextualizados evidenciam claramente as assimetrias sociais face à escolarização e alguns factores que contribuem para a forte diferenciação e deigualdade de resultados.

Podemos constatar, com raras excepções, que as escolas do litoral estão em clara vantagem sobre as escolas do interior.

Podemos constactar que as escolas das grandes metropoles estão sobrerepresentadas nas escolas com melhores resultados em detrimento das escolas da provincia.

Podemos constactar que as escolas em meio rural e no interior do país (com raras excepções) têm piores resultados nos exames.

Podemos constatar que as escolas ditas "problemáticas" aparecem quase todas em posições pouco prestigiantes.

Enfim, nada disto seria problemático se as escolas pior classificadas não ficassem estigmatizadas negativamente, "culpabilizando-se" subtilmente os maus resultados com o "mau" trabalho dos professores.

Não seria problemático se os paizinhos não saissem a correr para matricular os filhos nas "boas" escolas que são aquelas que estão no topo do ranking.

Não seria grave se as determinantes sociais não fossem ocultadas e se não fosse a "ideologia do dom" que é agora usada pelos professores das "boas" escolas. O bom resultado não é julgado pela composição social favorecida dos alunos mas sim pelo bom trabalho com os seus alunos.
Viva a mentira social!

Para terminar, gostava de dizer que poderia concordar com os rankings desde que estes fossem devidamente contextualizados com variaveis de caracterização socio-económica (como tentou fazer o ministro David Justino) e desde que isso contribuisse para os pais fazerem as suas escolhas de forma mais informada e equitativa (sabendo que os pais estão em situação clara de desigualdade face à escolha dependendo da suas distãncia cultural à escola).

Lamento é que "conceituados" jornalistas da nossa praça e não posso deixar de referir o director do jornal o público, sejam cegos (porque é de cegueira e de ignorância que se trata) na análise que fazem dos resultados do ranking em prole da sua ideologia que defende a mercadorização pura e dura da educação portuguesa.

Pelo lugar que ocupam e pela responsabilidade que têm como opinion makers no espaço público e estando este hoje largamente colonizados pelso media, estes senhores deviam ser seriamente penalizados pois condicionam negativamente a vida de muitas famílias e beneficiam claramente algumas delas!

Um abraço e votos para que um dia a Escola Secundária de Loulé seja um dia a primeira do ranking...seria sinal que já não havia por lá pobres.

3 comentários:

  1. João,

    Uma analise além de muito completa (direi mais,longa e exaustiva) como é o apanágio deste blog, também muito concreta e verdadeira ...!

    O erro parte do Ministério da Educação e acaba nos ditos "opinion makers" que comparam o incomparavel ...!

    E como sempre, levam os leitores a conclusões erradas ...!

    Terá que haver, neste caso e no Jornalismo em geral, mais cuidado no tratamento da informação e como informamos e/ou escrevemos ...!

    Podemos dar a nossa opinião mas não devemos ser irresponsaveis ...!

    Espaços como teu, deverão ser um exemplo para esta "cambada" que escreve por escrever e não pelo prazer de escrever, de comunicar ...!

    A grande escola que é ES de Loulé ...! Velhos e Bons Tempos ...!

    Um grande abraço,

    Miguel

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  2. Desprezar o ranking fas escolas com base nas condições sócio-económicas é condenar os alunos menos favorecidos ao insucesso. Porque É DISSO QUE SE TRATA.

    Porque é que NA MESMA ESCOLA, há professores que conseguem bons resultados e outros maus, COM OS MESMOS ALUNOS? Porque ele há bons professores e maus professores. O mesmo se aplica às escolas, enquanto sistemas vivos e interactivos. Há escolas com o mesmo padão de alunos, em que umas conseguem bons resultados e outras não.

    A teoria do "contexto sócio-económico" é racista e determinista, visa desresponsabilizar os professores e o ME e, no fundo, é a "teoria do dom" invertida.

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  3. Haverá um e-mail para onde posso contactar o Sr. João Martins

    Ass. Sérgio Martins (sergioxmartins@hotmail.com e www.algarveglobal.blogspot.com)

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