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quinta-feira, junho 22, 2006

O mundial dentro de casa

Pois é, a globalização tem destas coisas. Não vou à Alemanha ver o mundial, mas não tem problema, já que o mundial vem até mim.
Abençoada globalização.

Infelizmente porque não sou doente da bola e preciso de dinheiro para gastar em coisas mais úteis, tenho TV Cabo, mas não tenho Sport TV. Já agora aproveito e digo, não tenho, nem quero ter.

Mas este fenómeno social da monopolização privada do acesso à visualização dos jogos de futebol gerou um fenómeno interessante e simultaneamente discriminatório.
É que estamos a assitir a uma mudança na composição social dos espectadores dos espectáculos de futebol.

Este que sempre foi "o" desporto por excelência das classes populares está a sofrer uma recomposição classista. O seu público está-se a emburguesar.
Desde logo pelo preço dos bilhetes para assistir aos jogos de alto nível, só acessíveis aos bolsos de alguns e depois porque o acesso às transmissões televisivas está a ficar também só ao alcance de uns quantos.

Felizmente o pessoal da hotelaria recusou os planos do monopólio do capital e o bom povo pode sempre ir até ao café do bairro ver o que se vai passando na Alemanha.

Mas falemos dos principais protagonistas do espectáculo, as equipas e os seus jogadores.

A terminar a primeira fase, posso-vos dizer que gostei do bom futebol praticado pela Argentina, a Holanda e a Espanha.

Parece-me que vamos ter que contar com a Alemanha que joga em casa e está a jogar benzinho e também com a Inglaterra (meio campo fortíssimo)como potenciais candidatos.

O Brasil está a meio gás e vai ganhando sem grandes problemas. Não têm deixado jogar o "quadrado mágico".
O problema (para os seus adversários claro) é que quando estes tiverem que jogar o jogo pelo jogo, ai o Brasil vai sambar.

Portugal, não estando num grupo forte, cumpriu a sua missão. Em mundiais não há jogos fáceis e três vitórias em três jogos é um feito digno de registar.
Agora vem aí o "mata mata" como diz o mister Scolari e a partir daqui tudo é possível. Como alguém do mundo da bola disse um dia "deixem-nos sonhar".

Parabéns ao Equador e ao Gana que fugiram ao socialmente esperado e já ganharam o seu mundial.

Dos craques destaco Saviola, Riquelme, Messi e Crespo da Argentina. Fernando Torres de Espanha, Figo de Portugal (já sem velocidade mas com uma inteligência superior, o que é suficiente para o seu futebol continuar a encantar). Tivesse o Cristiano Ronaldo metade da inteligência de Figo... mas infelizmente o que lhe sobra noutras qualidades falta-lhe na capacidade de pensar o jogo.

Da Inglaterra há os que nunca jogam mal porque não sabem fazê-lo, são eles Lampard, Gerrard e Joe Cole.

Do Brasil claro, Ronaldinho Gaúcho e Kaka que quando lhes darem espaço vão desgraçar as defesas adversárias.

Balanço positivo desta primeira fase com muitos jogos agradáveis de se ver e com a tónica positiva de os árbitros até agora não se fazerem notar.

Suspeito que nesta fase do "mata-mata" a qualidade dos jogos vai piorar pois com equipas muitos equilibradas os sistemas tácticos fechados e defensivos vão imperar.

Abraços a todo o pessoal e boa sorte mister Scolari.

João Martins

domingo, junho 11, 2006

Futebol, media e nacionalismo bacoco

Já lá vai o tempo da célebre trilogia Fado, Futebol e Fátima. A Época Salazarista utilizou o futebol como instrumento de reprodução da ideologia dominante e como instrumento de legitimação do estado.

Slogans como "Nada contra a nação, tudo pela nação" ou "Portugal indiviso de Minho a Timor" serviam para a legitimação da dominação colonial e para provocar a ilusão de unanimidade onde existia a divisão e a conflitualidade.

A inculcação do nacionalismo pelo Estado servia de instrumento de legitimação do próprio Estado assegurando a dominação da elite dirigente do Estado Novo.

Hoje, já não temos Eusébio, mas temos os media que provocam a catarse nacionalista fomentando a histerese colectiva de um povo perdido de causas.

Em época de globalização, em que os Estados Nação perdem a sua soberania, em que ser cidadão do mundo pareceria ser uma evidência, temos aí a criação de uma identidade defensiva (o nacionalismo bacoco), que resiste à invasão do global tido como ameaçador e gerador de incertezas quanto ao nosso lugar do mundo.

Com a multiplicidade de referências identitárias com que somos bombardeados a partir da aldeia global, os individuos entram em crise de identidade.

A nacionalidade é um elemento identitário facil de agarrar e o futebol e os media têm todos os ingredientes para a alimentar.

O pior, é que se os nossos "heróis" contemporâneos não corresponderem às nossas expectativas, passamos rapidamente de um sentimento de orgulho na nação a uma nação depressiva.

Pois eu lamento, mas não tenho bandeira à janela, nem tenciono colocá-la.

Sou Louletano, Algarvio, Português, Europeu e sobretudo "Não sou Grego nem Ateniense, Sou um Cidadão do Mundo".

Cuidado com os nacionalismos bacocos em época de globalização...é que se nos fecharmos muito sobre nós próprios acabamos por despertar fenómenos como o racismo e a xenofobia. E estes estão aí mortinhos por despertar.

Boa sorte Portugal, que ganhe o melhor e que esse seja aquele que praticar melhor futebol.

Abraços
João Martins

domingo, junho 04, 2006

A Educação de Sócrates

Fantástica a afirmação de Socrates sobre o estado da educação nacional.
Diz-nos este brilhante cientista da educação que a educação nacional daquilo que precisa é de "menos ideologia" e de "mais resultados".

Para espanto meu, é possível um primeiro ministro em Portugal dizer uma barbaridade destas sem qualquer ponta de perplexidade e o mínimo questionamento por parte dos experts dominantes no status quo do espaço jornalistico nacional.

Vale a pena desmontar estas evidências de senso comum político e questionar afinal se poderá a educação não ser ideológica.

A questão de fundo será então:

- Pode a educação ser não ideológica?

E a resposta clara só pode ser, obviamente que Não.

A educação por natureza é ideológica pois é inevitavelmente um campo de lutas sociais e políticas. Educar é por definição ajudar a escolher futuros possíveis na vida dos indivíduos e não pode ser nunca apenas percorrer um caminho já traçado pelo 1º ministro do país e que se resume este a educar para a competitividade, numa lógica acrítica de submissão ao mercado capitalista neoliberal.

Deve a educação ser laica ou religiosa? A decisão é política e ideológica.

Deve a educação estar centrada nas artes ou nas ciências? A decisão é política e ideológica.

Homens e mulheres devem estudar juntos nas mesmas escolas e universidades? A decisão é política e ideológica.

O curriculo deve ser uniforme e estandardizado para os alunos de todo o território nacional ou deve ser adequado às especificidades dos locais e dos alunos? A decisão é política e ideológica.

A educação deve ser teórica e abstrata ou deve ser prática e concreta? A decisão é política e ideológica.

Os pais devem avaliar os docentes e as escolas ou afinal não devem porque se acha que não têm competência para tal? A decisão é política e ideológica.

O retrato de Salazar, Cavaco e Sócrates devem estar afixados por cima do quadro negro no interior das salas de aula ou não deve porque a vida partidária não deve estar presente na sala de aula? A decisão é política e ideológica.

O manual escolar deve ser único e o mesmo para todos os alunos ou pelo contrário deve ser diversificado permitindo aos actores escolares a escolha dos mesmos? A decisão é política e ideológica.

A gestão das escolas deve ser privada e feita por gestores ou pelo contrário pública e feita por professores? A decisão é política e ideológica.

A escola deve ser para todos e democrática ou só para alguns e elitista? A decisão é política e ideológica.

As famílias podem escolher as escolas e pagarem a sua qualidade ou não podem escolher e devem matricular os filhos nas escolas dos territórios ditos "problemáticos"? A decisão é política e ideológica.

O véu dito islâmico pode entrar nas escolas laicas ou pelo contrário deve ficar à sua porta e ser objecto de exclusão do espaço escolar? A decisão é política e ideológica.

As artes e o desporto deveriam ter mais horas no curriculo escolar e serem de aproveitamento obrigatório para se transitar de ano ou devem ocupar uma posição de saberes subalternos no espaço escolar e não contarem para transitar de ano? A decisão é política e ideológica.

Pois é senhor Sócrates "menos ideologia" e mais "resultados" porque afinal as escolhas fundamentais o senhor já as fez, quanto ao resto o senhor ensina-nos como lá chegar.

Olhe deixo-lhe uma passagem de Émile Durkheim, brilhante sociólogo da educação de finais do século XIX para que possa meditar no assunto:

“Quando estudamos historicamente a forma pela qual se formaram e desenvolveram os sistemas educacionais, apercebemo-nos de que os mesmos dependem da religião, da organização politica, do grau de desenvolvimento das ciências, do estado da indústria, etc. Se os desligarmos de todas estas causas históricas, eles tornam-se incompreensíveis” (Émile Durkheim in Educação e Sociologia,1922).

Abraços e beijinhos para o pessoal da blogoesfera.

João Martins